Alguém disse e muito bem
que quando se envelhece
há três coisas que convém
manter e, nunca se esquece:
os óculos para enxergar
dentadura pra comer
e, para o céu alcançar,
uma Bíblia pra se ler
Digam lá que a velhice
também não tem seus encantos?
Todos querem lá chegar
mesmo que com alguns prantos
Não sei de quem foi a ideia
de pôr rótulo à idade
primeira, segunda, terceira,
até parece maldade
É certo que vai doendo
aqui, ali, acolá,
mas, mesmo com ais gemendo,
se pode ficar por cá
Já não tem a mesma graça
já não é tão divertido
há sempre um mal que embaraça
o tempo é menos comprido
A comida faz azia
dorme-se menos e mal
o prazer faz alergia
sorrir de quê, afinal?
Para se atar o sapato
a perna tem que torcer
a barriga sai do fato
já nada há a fazer
No entanto, a vida é bela,
mesmo que de entorses cheia
cada um governe a sua
e não perturbe a alheia
E assim cantando e rindo,
levados, levados, sim...
vamos todos resistindo
eu cá, só falo por mim...
O OUTONO chegou
que lindo dia!
Vem, amor,
vem passear comigo pela rua,
que bom vai ser
sentir a minha mão na tua.
Olharemos o céu
com o mesmo olhar extasiado,
que bom vai ser
pisar as folhas a teu lado.
Ouvir o pássaro cantar
por sobre o ramo despido
e o sussurrar do teu amor
no meu ouvido.
Gente irá passando
alheada junto a nós,
que bom vai ser
sentir o mundo
e estarmos sós.
Num banco de jardim
soprado por fresca brisa
falar-te-ei de mim
serei poetisa.
Mas, se a brisa soprar
mais fresca e mais agreste,
irei buscar
o xaile que me deste.
E o brilho do nosso olhar
que em ternura se reflecte
será poesia, canção,
magia que se repete.
Chegas amanhã, Outono, e como eu te esperei...
Setembro vai caminhando já com sinais de cansaço, desmaiando aqui e ali em cores que o sol não domina nem protege.
A brisa vai soprando já com prenúncios de mudança. Sopra mais ligeira, mais atrevida. Sem o peso de canículas e chuvas de Verão. Agita uma folhagem perdida no alvoroço do seu destino, sem tréguas e sem esperança, caíndo em solo alheado.
Sinfonia triste de uma balada todos os anos repetida.
Doce aquietar de sonhos vividos em partilha aceite e consumada.
Tempo de vindimas. Os bagos inchados de seiva de ternura e temperados de alegria apetecida. Uma apoteose de néctares e cantigas, risos e danças.
Outono...
O recomeço das aulas.
Batas vestindo risos, moldando emoções. Bandos de criançadas. Pássaros chilreando em algazarra colorida. Alguns saídos de ninhos acolchoados de amor para um primeiro voo, numa aventura que ainda amedronta mas excita.
Reencontro de amigos. Mistura ruidosa de jeans e abraços. Um reviver de momentos passados na partilha de gargalhadas e soluços. O relato de férias férteis em sol e lazer.
Outono...
O cheiro das castanhas assadas. Quentura estaladiça entre mãos que se tisnam de cinza escaldante.
E a brisa fresca empurrando fumos de assadura, perdidos depois em ruído e poeira.
Choram já as folhas pisadas em gemidos, sem eco na indiferença da multidão em faina apressada.
O sol com um brilhar mais cálido e suave, perdendo-se em acenos rubros e silenciosos lá bem nos confins do horizonte...
Como te esperei, Outono, para uma vez mais te celebrar em veleidades de poeta.
E amanhã, só amanhã poderás ler o meu poema.
Hoje disseram-me
que o meu olhar tinha um brilho especial.
Talvez!.
Cada beijo teu
orvalhou na minha pele
e amanheci coberta de frutos.
Meu corpo -pomar
conservou o odor sensual
da maçã proibida
e, fui pela manhã,
a Eva dos teus paraísos
Deus construiu o mundo, deu-lhe forma
fez montanhas, o mar, o infinito,
depois de tudo pronto fez a norma:
"Que a mulher gere o homem" ficou escrito
Após ter feito o homem igual a si
Ele criou a mulher pra o completar
paradoxo que nunca compreendi
e jamais alguém ousou explicar
Se Deus é homem, força, se é poder,
porquê a mulher mais perfeita conceber
agraciando-a com a maternidade?
Deus tem de ser mulher! Quem mais podia
criar amor, beleza e harmonia
e ser a mãe de toda a humanidade?
Apenas sobrevivi porque te inventei...
Inventei-te nas marés de desejo que invadem repetitivas a minha praia de areias ansiosas.
Inventei-te na dança das gaivotas emprenhando as vagas.
Inventei-te, amor, no tecer das algas, no mar com búzios, desenhando sombras pela espuma, em patético apelo à vida.
Inventei-te no côncavo das conchas, onde procurei a humidade dos teus beijos; nas estrelas do mar, com que formei um lençol, para sofrer no teu corpo a agonia do amor.
Inventei-te para me abandonar no meu castelo de sílica, deixando que as minhas lágrimas, misturadas com as ondas, fossem o dilúvio e exilei-me então no meu vazio, no meu mar de corais e rebeldias (a minha simbiose dos silêncios).
Inventei-te para me surpreender de novo
na erosiva procura de ti.
As contas do meu rosário são poemas
que ofereço em oração quando estou triste
memórias enfeitadas, diademas,
com que corôo esta fé que me assiste
Rezo a um Deus só meu e que preservo
de olhares incautos, pérfida malícia
recolho-me serena e assim conservo
em pleno Sua graça, qual carícia
Um a um vão meus poemas deslizando
por minhas puras mãos, acariciando,
meu rosário de amor e de marfim
Em patético terço os meus pecados
vão compondo a letra dos meus fados
findam em qualquer Cristo que há em mim.
Respirarás meus sopros de serpente
astros interrogando em desespero
e a gravitar com sonhos de demente
alucinarás na luz do sete-estrelo
Inventarás metáforas de loucura
cumplicidade de ventos e fogo
entrincheirado em formas de amargura
incendiarás em raivas teu malogro
Acabarás descobrindo em memórias
noites de paixão, no ardor de beijos,
relembrarás no corpo ódios e glórias
resvalando nas margens de desejos
Quando, por fim, esgotado em espanto
atento me olhares, serpente que voa,
meu veneno beberás, enquanto,
pra te salvar tarde será, perdoa.
A terra é rasgada pelas mãos calosas
de homens e mulheres em faina de cor
o vinhedo brota e, vozes orgulhosas,
vão cantando a lida em debruns de amor.
A visão é bela, arquitectura pura,
nuances que nem Baco sonharia
salpicadas aqui e ali pela verdura
santuário de oração, choro e alegria.
E o rio é uma serpente prateada
humedecendo recônditos pedaços
vai em dança suave, ondulada,
espargindo odores, néctares de abraços
. Em cachos coloridos estão as uvas
perfiladas no solo em soberbo alinho
grávidas de sol, de brisa, de chuvas,
clamando colheitas, vindimas, o vinho.
Oh, Douro, de correntes, remoinhos!
Douro azul, verde, cor estonteante!
Tens garças e outros pássaros em ninhos
e o Barco Rabelo como fiel amante!
Já lá dizia Marcelo
em conversa semanal
colocando em paralelo
dois homens em Portugal.
Sócrates era o sufflé
Mendes era o empadão
Mas de peixe é que não é
e de carne também não.
Afinal o que nos resta
para engolir em política
se esta "massa" não presta
então o que é que nos fica?
Iremos morrer à fome
por falta de competência
tanta gente que tem fome
e aumenta a "flatulência"
Ficamos todos à espera
do "cozido à portuguesa"
entretanto, quem nos dera,
ter algo em cima da mesa!!!!
. NEVOEIRO